sexta-feira, janeiro 28, 2011

um dia haverá tempo para desistir
um dia distante, talvez, mas ainda a tempo
de eu sentir que estou sinceramente
a tempo de desistir

um dia
tudo vai fazer sentido
e eu vou deixar de estar cansado
um dia, talvez, mas que seja um dia
pleno, um dia como nenhum outro
manhã dourada cega
dolorosa como o punhal no peito
que rasga o pulmão a direito
mas ignora todos os tecidos

ah... a grande cobardia de estarmos vivos!
a enorme cobardia de não ousarmos
o passo final para o esquecimento de
nós próprios, a companhia sincera e distante
do negro universal - nossa mãe e nosso pai

não vês lá longe em cima
as vidas destroçadas
pontos de luz separados uns dos outros
e entre eles toda a liberdade sem fingimento
de quem já não quer nada, de tudo o que não é
e tu com vontade animal de
te lançares para perto dessa verdade
mas sem o orgulho puro dentro de ti

apetece-me tanto desistir
deixar para trás toda a ambição,
mas toda a minha vida foi um fracasso de tudo,
sobretudo o fracasso em deixar de ser.
mãe que não conheço: o teu filho falhou em tudo
e não tens orgulho sequer no terrível
momento da decisão final, da decisão mais simples
ele que não quer deixar de ser
pela necessidade mórbida de ter de ser alguém
ele falhou e continua a falhar
mecanismo partido
que bate contra a maré que nunca esvazia
que continuamente bate contra mim
que sem parar não me deixa dormir
incansável, repetida, impiedosa
e tudo a acontecer sempre assim
nos dias repetidos da minha vida cinzenta
sem pavores e sem esperança nenhuma
sem nada de nada que mereça olhos abertos, luzes,
nada de nada assim
nunca mais, preso a sensações passageiras.

falhei em tudo, mãe, que nunca me quer ouvir.
falhei em tudo, mesmo na necessidade
macabra de deixar de falar no meu fracasso...

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