quinta-feira, maio 27, 2004
Há um grande frio que penetra esta casa. Que entra pelos espaços que ficaram marcados pelo tempo na madeira velha.
Dias há em que eu me sento imenso no alpendre velho e fico sem respirar a ouvir os sons de ameaças que vêm do mar. Consigo ouvi-los e eles não me conseguem ouvir a mim. Passados uns segundos, o meu corpo é uma parte da velha casa e os múrmurios abandonam-se por entre as minhas células, no espaço deixado pelo tempo.
Lentamente agito-me com a velha casa. Acabo por tremer pelas mesmas ansiedades, como o grande carvalho que ameaça invadi-la pelas manhãs de Outono, chove cobre nas minhas memórias dos que morreram e que já correram no pátio abandonado.
Em volta da fonte coberta de ferrugem, de um querubim sem uma asa, pequenos pardais cantam o sortilégio de uma vida insconsciente e eu não sei o que pensar na minha apneia sufocante. Ouves o vento que sopra do mar o barulho corroido das ondas em maresia...?
Um frio horrivel percorre toda a minha carne, olhando-me por dentro, sem saber o que está a sentir. É uma invasão de um povo que apenas quer passar para outra terra, outro território e que nem sabe o que destrói pelo caminho ou sequer que pode destruir.
Lembro-me de uma juventude perdida nesta pasmar solene, olhos fixos onde acaba a floresta e começam as dunas da praia.
Lembro-me vividamente de correr de pés descalços por sobre as folhas secas, do barulho macabro dos meus punhos no tronco das árvores, olhos fechados, dentes a ranger, para depois sentir o calor do sol que caía já no horizonte - nunca tive coragem de ir àquela praia senão quando raiava a noite no meu coração.
Porque me lembro assim do que nunca vivi? De pegar pela mão um outro corpo e o puxar para o chão macio. De o sentir preso de movimentos, para depois o largar pela futilidade que é resistir.
É verdade que os meus passos se fizeram pesados na areia molhada, mesmo que já não se vejam. É o sonho ou são as marés que os apagaram tão violentamente como eu os terei marcado?
Às vezes adormeço assim, velho, no alpendre gasto.
Só a sentir o vento que passa por mim, frio como eu, pelo espaço deixado pelo tempo em mim.
Há tantas coisas no sonho e tantas coisas na vida e tantas coisas no sonho que não há na vida.
Dias há em que eu me sento imenso no alpendre velho e fico sem respirar a ouvir os sons de ameaças que vêm do mar. Consigo ouvi-los e eles não me conseguem ouvir a mim. Passados uns segundos, o meu corpo é uma parte da velha casa e os múrmurios abandonam-se por entre as minhas células, no espaço deixado pelo tempo.
Lentamente agito-me com a velha casa. Acabo por tremer pelas mesmas ansiedades, como o grande carvalho que ameaça invadi-la pelas manhãs de Outono, chove cobre nas minhas memórias dos que morreram e que já correram no pátio abandonado.
Em volta da fonte coberta de ferrugem, de um querubim sem uma asa, pequenos pardais cantam o sortilégio de uma vida insconsciente e eu não sei o que pensar na minha apneia sufocante. Ouves o vento que sopra do mar o barulho corroido das ondas em maresia...?
Um frio horrivel percorre toda a minha carne, olhando-me por dentro, sem saber o que está a sentir. É uma invasão de um povo que apenas quer passar para outra terra, outro território e que nem sabe o que destrói pelo caminho ou sequer que pode destruir.
Lembro-me de uma juventude perdida nesta pasmar solene, olhos fixos onde acaba a floresta e começam as dunas da praia.
Lembro-me vividamente de correr de pés descalços por sobre as folhas secas, do barulho macabro dos meus punhos no tronco das árvores, olhos fechados, dentes a ranger, para depois sentir o calor do sol que caía já no horizonte - nunca tive coragem de ir àquela praia senão quando raiava a noite no meu coração.
Porque me lembro assim do que nunca vivi? De pegar pela mão um outro corpo e o puxar para o chão macio. De o sentir preso de movimentos, para depois o largar pela futilidade que é resistir.
É verdade que os meus passos se fizeram pesados na areia molhada, mesmo que já não se vejam. É o sonho ou são as marés que os apagaram tão violentamente como eu os terei marcado?
Às vezes adormeço assim, velho, no alpendre gasto.
Só a sentir o vento que passa por mim, frio como eu, pelo espaço deixado pelo tempo em mim.
Há tantas coisas no sonho e tantas coisas na vida e tantas coisas no sonho que não há na vida.
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